Alcançando o improvável
Ao assistir Blade Runner: Caçador de Andróides (1982, porém, há trocentas versões do filme, 5 na verdade, eu que sou exagerado, mas a minha recomendação vai para Final Cut, de 2007, feito o disclaimer...), notamos que o filme se fecha nele mesmo, é o uma história conclusiva, apesar de ser deixada em aberto o que pode acontecer, vemos o arco dramático do personagem principal, Rick Deckard (Harrison Ford) e de sua amada Rachel (Sean Young) por completo. Porém, sabemos como funciona Hollywood, a indústria da arte e do money funcionam e, apesar de uma péssima bilheteria inicial, o filme ganhou um status Cut, seja por seus relancamentos, teoria dos fãs ou de seu design, som e direção de artes inovadores, o quais moldaram os rumos do "sci fi" durante anos a fio, os produtores da terra do tio Sam adoram franquias que tenho renome, para tentar capitalizar em cima de uma certa "renovação" no produto, as vezes transformando em algo completamente diferente do original, perdendo a alma no processo.
Mas para despreocupar a todos logo de início, eles anunciaram que um diretor de renome iria dirigir, Dennis Villeneuve, que havia dirigido poucos anos antes uma série de filmes excelentes, como Incêndios, O Homem Duplicado, Suspeitos, Sicário e a Chegada, numa sucessão de obras realmente marcantes e desafiadoras, que solidificou a carreira do realizador como um dos melhores diretores que surgiram nos últimos anos, mas que, envolvido num modelo de indústria cinematográfica que ainda presa o lucro a qualidade, ainda faltava um ponto a provar o diretor, um filme de grande orçamento.
Blade Runner 2049 é um milagre, é muito difícil temos um filme com um orçamento tão grande que temos (ao menos o que tudo indica) uma obra que é editada e finalizada com a visão de seu diretor, sem que hajam visões artísticas e mercadológicas se debatendo no mesmo longa (o que irei analisar melhor em franquias mais escapistas),temos aqui um filme que começo, meio e fim, fechado nele mesmo, com uma exceção sendo a cena final, que abre, mesmo que de forma implícita, espaço para uma sequência, proveniente de elementos apresentados durante o filme, que são ligados a essa cena em específico.
Analisando por esse espectro, a história, que deveria ter um ar mais contido em relação a escala do universo criado, as vezes explora a vastidão de tematicas e de escala, o que no primeiro filme serve apenas para dar um contexto, aqui entra no plot do filme, esses momentos atrapalham muita das vezes a compreensão da história e a assimilação da narrativa, como se uma proporção macro e micro brigassem por espaço, talvez esses são os momentos mais fracos do filme, já que ele tenta contruir uma abrangência maior, falhando pela falta de contexto e por diversos pontos sem explicação da trama.
Na história acompanhamos K (Ryan Gosling, comendo cereal como sempre, mas efetivo aqui) um replicante que trabalha para a policia, que após caçar um outro replicante e o "aposentar" (termo usado para o assassinato de um replicante e que ganha enormes variantes se pensarmos um pouco melhor), se vê envolto em um mistério envolvendo o desaparecimento de Rick Deckard e de Rachel, o casal do primeiro filme, que ao que parece tiveram uma filha, o que contradiz tudo do que se pensavam sobre os replicantes, algo que poderia inverter a ordem natural das coisas, o que entra em conflito com a busca incessante de Neander Wallace (Jared Leto, menos afetado, porém ainda afetado, do que o normal), um magnata que procura a procriação dos replicantes, porém não consegue achar a "chave" que falta para seu objetivo.
O filme de modo geral pode ser definido como um Neo noir investigativo, que, diferente do primeiro, a caçada ganha um pessoal completamente pessoal conforme a trama avança, tanto para K, que começa a conhecer seu lado mais humano, muito atravéz de sua companheira virtual, de nome Joy (Ana de Armas) que lhe mostra contrapontos românticos e ao mesmo tempo carnais (irônico, já que ela nao possui um corpo físico) e tanto para Deckard, que ao decorrer do filme é encontrado e começa a criar contato com o mundo que o mesmo abandonou, numa desolada Las Vegas (já posso falar sobre a direção de arte e fotografia do filme?), recuperando coisas que o mesmo deixou para trás.
Agora posso falar do ponto quase perfeito do filme, sua estética, seja pela direção de arte, fotografia e som, o filme se destaca sendo o inovador e extremamente hipnótico, assim como o primeiro, o uso de cores, a fotografia premiada de Roger Deakins, o cuidado com os detalhes, que vai do figurino até os artigos que servem de background, é impecável, isso torna o filme, assim como foi lá trás, uma nova vanguarda de quando o assunto é fazer um filme sci fi futurista.
Blade Runner 2049 é uma experiência única, a visão do seu diretor e de todo o corpo técnico parece não ter sido imaculada por nenhum devaneio de pessoas que visam apenas o lucro e o hype, o que torna esse filme uma obra prima, talvez o roteiro seja o ponto fraco, não pela história de investigação, que ganha contornos pessoas ao decorrer do processo, mas sim a presença de elementos externos a essa investigação, mas a estética do filme salva todo resto, é um filme brilhante de se assistir, que exige degustação de seu expectador, não espere tiro, porrada e bomba, o que acontece em poucos momentos, mas espere uma história humana e reveladora, que queima lento, mas compensa ao final de suas mais de 2 horas e quarenta.
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