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Foto do escritorHelder Fernandes

American Fiction (2023)

A realidade e a sátira.


Qual o trabalho do escritor de ficção se não o de imaginar acontecimentos, baseados ou não em sua a vida? E como isso impacta nas suas relações pessoais? Há um esteriótipo que diz que pessoas geniais estão fadadas a andar sozinhas, retraídas e reclusas, mas afinal de contas, a solidão muita das vezes é só um vazio que colocamos sobre as outras pessoas, como diria Alain de Botton, dito isso, o que nos coloca esse sentimento de rejeição e afastamento sobre os outros?


Bom, se você achou que eu fiz muitas divagações na hora de começar esse texto, espere até assistir American Fiction, adaptado do livro “Erasure”, o interessantíssimo filme do estreante Cord Jefferson que tem um ator espetacular como Jeffrey Wright no papel principal. Antes de começar a tratar sobre o filme, quero explicar que ele se trata de uma sátira, que nada mais é que tratar de uma forma irônica sobre determinado assunto, aqui, retrata justamente o papel do negro na cultura e isso se alastra por diversos aspectos.


Na trama, temos um professor e escritor chamado Monk (Wright) que se vê cansado do papel que seu povo vem desempenhando na cultura, tanto na escrita como na representatividade, em paralelo a isso, temos a vida do próprio escritor, que justamente elucida a sua alienação em relação ao mundo, numa noite inspirada por produtos culturais que ele trata como inferiores, ele tem uma ideia de escrever um livro que mais parece uma chacota com tudo isso que vê, mas que de forma inesperada se torna um sucesso, um item valioso para pessoas que não moram nos guetos e querem achar que sabem de alguma coisa.


Vou tratar de um lado pessoal aqui, pois moro numa comunidade, ninguém sabe como é a favela como quem mora lá, mas muita das vezes, vemos produtos com a mesma temática, escritos por pessoas que só vem o que é a fome, a pobreza, a criminalidade e a sensação de comunidade e companheirismo que também existe ali por páginas policiais, por produtos audiovisuais ou pela leitura e o filme toca nisso de uma forma muito profunda, apresentando uma discussão riquíssima sobre o tema, é impressionante como que na verdade, aqueles que detém os direitos de distribuição sobre o relato da periferia na grande maioria, são pessoas que nem sabem o que é isso, pois já nasceram num berço privilegiado, a cultura de gangue e opressão quase soa como uma fantasia para esse tipo de pessoa, algo muito mais para atender uma necessidade mercadológica do que de fato apresentar uma versão nua e crua da realidade.


Em paralelo, temos a relação de seu protagonista com sua família, o que da um alto grau de realismo a trama, sempre gostei muito de Jeffrey Wright, é um ator que com poucos movimentos corporais e faciais, consegue compor uma atuação cheia de nuances e o filme é feito para ele brilhar, ele que começa com o típico personagem turrão e ranzinza, aos poucos começamos a perceber por que o personagem é assim, o por que ele parece afastar e se alienar de tudo e todos a sua volta, a ponto de não conhecer de verdade nem quem é a sua família, como se ele de fato não pertencesse a lugar nenhum.


O elenco do filme é top de linha, com destaque para Sterling K Brown, que temporada do ator, que aqui faz o irmão de Monk, que é completamente a antítese do protagonista, que enquanto Wright encarna o cerebral solitário, Brown é o eudonista por completo, num ótimo trabalho que assim como Jeffrey, também lhe garantiu uma indicação ao Oscar.


Apesar de um roteiro riquíssimo e performances acima da média, o filme parece um pouco simplista demais, não falo que algo assim precisava de algo grandioso, mas, em aspectos de fotografia e até de trilha sonora, temos uma obra pequena que é engrandecida por um ótimo diretor, um elenco acima da média e um roteiro cheio de discussões e que torna o filme um dos grandes destaques dessa temporada de premiação.


Nota 9,0/10




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